RIO – Se TV tivesse cheiro, os espectadores perceberiam que até o perfume que Adriana Esteves está usando era o que Dalva de Oliveira usava.- Fleur de Rocaille. Era o da minha mãe também – diz Adriana, estrela da minissérie “Dalva e Herivelto, uma canção de amor”, exibida até esta sexta-feira na Globo. Quando voltar de férias da Bahia, onde está com a família esta semana, ela terá de dar um jeito no seu quarto. – O perfume está lá, revistas da época da Dalva, fotos, CDs…
Atriz que começou como modelo de comerciais de TV, despontou como “Musa do verão” do “Jornal do Brasil”, formou-se em publicidade, foi apresentadora de um quadro do “Domingão do Faustão”, mocinha de novela nos anos 1990 e boa de comédia nos 2000, Adriana Esteves descobriu o drama. Sua capacidade de incorporar a carga dramática do rosto, dos trejeitos de cantora e da biografia de Dalva – além de entrar na musicalidade da interpretada – é o que muitos estão considerando o melhor de “Dalva e Herivelto”.
Adriana se assustou ao receber o convite do diretor Dennis Carvalho para a minissérie. Não só por sua pouca experiência com papéis musicais (até então, apenas a cantora Lola na novela “Kubanacan”), mas porque estava há três anos no tom de comédia de “Toma lá, dá cá” e ainda gravava o programa quando veio o convite:
– Tive de gravar os dois juntos. Aliás, as gravações de ambos terminaram no mesmo dia, no fim de novembro.
Para se desligar da comédia e se ligar no drama de Dalva, a atriz, que se preparou por dois meses e meio, aproveitou uma experiência semelhante que havia tido no início do programa de humor.
– Fiz o começo dele com a peça “Virgolino Ferreira e Maria de Déa – Auto de Angicos” (pela qual foi indicada ao Shell de melhor atriz). Tinha que ser a Maria Bonita num, a Celinha noutro. E um me relaxava para o outro. Então, soube que aconteceria o mesmo com Celinha e Dalva – conta a atriz, acrescentando que a montagem também a ajudou a compor Dalva. – Eu não queria a imitação, queria só uma semelhança. E, na peça, o (diretor) Amir Haddad me ensinou isso quando se tratava de interpretar alguém que já existiu, como a Maria Bonita: pesquisar, não só a biografia, mas a visão que as pessoas tinham dela, na época e agora; e tirar minha impressão disso tudo. Preocupar-se só em apresentar uma história e um imaginário.
Para a parte musical da minissérie, Adriana primeiro decorou as letras e ouviu as canções. Depois, teve aulas com a cantora lírica Mirna Rubim, que lhe deu lições como registro de graves e agudos. Então, passou para as fonoaudiólogas Marly Brito (que a auxiliou na dublagem das músicas) e Edi Montecchi (que neutralizou seu sotaque carioca).
Adriana também conversou com parentes da cantora e gente que conviveu com ela:
– E o que mais chamava atenção, nessas conversas, era a simplicidade da Dalva ao tratar as pessoas. Então, fui atrás de como seria a minha própria simplicidade.
Destaque em novelas como a vilã Sandrinha de “Torre de Babel” e a megera domada Catarina de “O cravo e a rosa”, ela reconhece que, por um tempo razoável na carreira, foi vista só como a mocinha. Nessa época, nos anos 1990, é que passou por críticas contra sua atuação em “Renascer”:
– Eu tinha 23 anos, e me deram aquele papel protagonista porque sempre fui responsável. Mas, aí, inventaram de dizer que não estava bom, e fiquei muito abalada, me senti a última pessoa do mundo. Agora, lembrando, acho que foi um dos meus melhores trabalhos. Que pena que eu tinha 23. Se tivesse 40, como agora, não teria sofrido tanto.
Diretor musical de “Dalva e Herivelto”, Mariozinho Rocha se espantou quando soube que Adriana estava escalada para o papel. Dalva não era bonita, e Adriana, nas palavras de Rocha, “é uma princesinha”. Chegou a questionar a escolha com Dennis Carvalho. A maior preocupação dele vinha de uma experiência anterior com a atriz.
– Ela não é muito musical – justifica ele, que já tinha trabalhado com ela em “Kubanacan”.
Na época, a própria atriz queria evitar as cenas de canto. “Não me faça cantar”, dizia a Rocha. “Eu não canto nem no chuveiro”. O diretor tentava acalmá-la. “Pode deixar que o Pro Tools resolve”, rebatia ele, referindo-se ao software mágico que conserta qualquer desafinação nas gravações de hoje. Adriana não se convencia: “Eu vou enlouquecer o Pro Tools”. Não se sabe se o Pro Tools enlouqueceu, mas as cenas de canto de Lola foram eliminadas da novela.
Adriana foi dublada na minissérie, mas, segundo Mariozinho Rocha, é preciso ter técnica musical até para ser dublada, e, desta vez, ela conseguiu:
– Com este trabalho, Adriana Esteves entrou, com tranquilidade, para o primeiro time de atrizes brasileiras. Pelo amor de Deus, ela incorporou a Dalva!
Foi assistindo a uma chamada de “Toma lá, dá cá” que Dennis Carvalho teve a ideia de chamar Adriana:
– Fiquei uns dias olhando para a foto de Dalva até a imagem de Adriana aparecer na tela. Na hora falei: é ela! Peguei uma foto da Adriana e fiz uma montagem transformando-a em Dalva. Fui ao estúdio, mostrei a foto para ela e disse “olha quem vai fazer a Dalva de Oliveira”. Ela quase desmaiou.
Filho de Dalva, Pery Ribeiro está encantado com a transformação e a atuação de Adriana:
– Quando tivemos os primeiros contatos, ela me perguntava como a minha mãe agia, como ela era no palco. E, sempre que eu contava alguma história, ela se emocionava profundamente. Isso me fez imaginá-la como uma pessoa com uma sensibilidade fora do comum, mas não imaginei que fosse tanto. Ela está com os olhos da minha mãe.
Fonte: http://m.oglobo.globo.com/cultura/revista-da-tv/adriana-esteves-sem-jeito-de-mocinha-nem-tom-de-comedia-brilhou-como-dalva-de-oliveira-3071429