Em meio ao conflito da fama e do anonimato, podemos encontrar o protagonista de Bingo – O Rei das Manhãs, Augusto Mendes. Acontece que o intérprete de Bingo, o palhaço mais amado pelas crianças dos anos 80, por questões contratuais, não pode revelar a identidade por trás da máscara do ídolo infantil.
Bingo, no entanto, é uma representação fictícia do palhaço Bozo, vivido por Arlindo Barreto em meados dos anos 80, no SBT. A obra, embora aborde a temática do palhaço, é um drama. A vida de Arlindo Barreto é retratada como outras tantas cinebiografias que abordam a ascensão e decadência de um artista, mas de uma maneira memorável.
O diferencial do filme é o brilhante e ácido roteiro de Luiz Bolognesi, que além apresentar de maneira ágil e eficaz a dubiedade da personalidade de Augusto, enquanto artista e ser humano, nas diferentes fases de sua vida e carreira, nos coloca dentro do espectro pop dos anos 80, alinhado com a direção do renomado montador de Cidade de Deus (2002) e Tropa de Elite (2007), Daniel Rezende.
A escolha por cores altamente saturadas na estética do filme, dando contraste à maquiagem carregada do palhaço, cumpre com excelência a proposta do longa de representar os exageros dos anos 80. Pode-se dizer que o filme pauta os excessos com maestria. O conflito entre o excesso de anonimato e o excesso de fama, somado ao exagero no consumo de álcool, drogas e pornografia, tonifica a narrativa de maneira sutil, sem apelar para o clichê, embora aborde uma temática que é bastante usual em outras cinebiografias.
O destaque vai para a assertividade da performance de Vladimir Brichta ao dar o tom para os dois personagens que interpreta: Bingo, o palhaço de tiradas sagazes, e Augusto, o homem e pai cheio de conflitos internos que tem a sua integridade abalada pelo uso de drogas, ratificando a máscara existencial entre o personagem e o artista representados.
Bingo provavelmente é um balde de água fria na infância de muita gente que amava o palhaço Bozo, mas é um drama com momentos de comédia e vivacidade certeiros, como no momento em que Emanuelle Araújo encarna a rainha do rebolado, Gretchen, dançando o sucesso Conga, Conga, Conga. Bingo alterna, com o timing perfeito, o drama, a melancolia e o humor de modo a me permitir dizer que o filme destruiu infâncias com muito bom gosto.
Texto por: Laura Guimarães.
Confira o trailer: