Dois titãs da cultura brasileira, Machado de Assis e Julio Bressane, encontram-se em “Capitu e o capítulo”. Como o título do filme sugere, o ponto de partida vem do romance “Dom Casmurro” — a queda vertiginosa de Bentinho no abismo da suspeita de traição. Já o ponto de chegada, como ressaltam as imagens de bastidores das filmagens que acompanham os créditos finais, oferece um olhar reflexivo (repare no uso de espelhos) sobre o conjunto da obra do próprio cineasta.
É machado-bressiana, portanto, a alma desse ensaio cuja montagem emprega trechos de outros 11 filmes do diretor, de “Cara a cara” (1967) e “Matou a família e foi ao cinema” (1969), que inauguraram a sua inestimável trajetória de invenção, até “A longa viagem do ônibus amarelo” (2023), que a condensa em uma jornada de mais de sete horas de duração. Esse material autorreferente fornece transições e comentários para a estrutura dramática, extraída do romance de Machado (que aparece como personagem, interpretado por Enrique Diaz).
Os célebres “olhos de ressaca” de Capitu ( Mariana Ximenes ) conduzem Bentinho ( Vladimir Brichta ) a um pesadelo recriado com um pouco da gramática do cinema de terror. Já a figura do escritor, além de se referir à própria criação enquanto conversa com a câmera (e portanto com o espectador), traz à pauta outras referências literárias, como Álvares de Azevedo e Junqueira Freire. Um filme de Bressane para conhecedores de Bressane, uma releitura de Machado para admiradores de Machado.
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