Não restam dúvidas de que 2012 foi o ano de Adriana Esteves. Sua interpretação como Carminha em “Avenida Brasil” será para sempre lembrada, e ainda estamos tendo a oportunidade de ver a atriz ser indicada pela segunda vez como melhor atriz ao International Emmy Award, o prêmio mais importante da televisão mundial, por sua atuação como Fátima na minissérie “Justiça”.
Nosso site relembrou o mega sucesso “Pedra sobre Pedra” através de um dossiê sobre a novela. Então, que tal hoje, relembrarmos a expectativa do público e da atriz diante de sua primeira protagonista: Marina Batista?
A PEQUENA NOTÁVEL
Adriana Esteves conquista o público brasileiro e se consagra como atriz em seu segundo papel importante na televisão
O casamento ainda não tem data marcada. Mas o Brasil, quem diria, está namorando outra vez. E parece que mudou de gosto. O jeito cândido e a pele branquíssima que no começo da década de 70 fizeram da paulista Regina Duarte enamorada do público da Rede Globo agora já não impressionam tanto quanto o corpo malhado e colorido pelo sol e a veia carioca da atriz Adriana Esteves. Os anos se passaram, e a estratégia de aproximação e o jogo da conquista também hoje são diferentes: bastam uma ou duas novelas de bom ibope, dois ou três papéis de boa moça e, pronto, está feito o enlace.
Os 22 anos da menina que mal fez sucesso arranjou marido e saiu de casa às vezes não parecem suficientes para segurar o peso do novo personagem o de namorada dos televisivos. “Choro todos os dias”, confessa a instável Adriana Esteves. Mas não seria só de tristeza, tampouco só de alegria. Emoção à flor da pele bronzeada, ela se debulha é pelas duas coisas. “Há dias em que chego das gravações arrasada, achando que não dei o máximo de mim numa cena, fico chateada e as lágrimas começam a escorrer. No meio do caminho lembro que tudo na minha vida está dando certo e o choro passa a ser de felicidade.
A nova namoradinha do Brasil é assim. Tem algo de pós-adolescente na maneira de falar e atitudes conservadoras que só fazem confirmar o passado suburbano: casou-se aos 19 anos de véu e grinalda e costuma dizer que nasceu para ser mãe. Quando discorre sobre o romance entre Marina e Leonardo – ela e Maurício Mattar em Pedra sobre pedra -, adora compará-lo ao de Romeu e Julieta. Na hora de questionar as exageradas semelhanças entre a novela de Aguinaldo Silva e Roque santeiro, de Dias Gomes, sai pela tangente. “Em 1985, quando passou Roque santeiro, eu não era atriz e nem tinha o olho clínico de hoje em dia. Não tenho condições de opinar muito sobre esse assunto.”
ADJETIVOS ÓBVIOS – No duro, no duro, Adriana Esteves opina bem menos do que muito pouco. Para os colegas, só rasga elogios. “Renata Sorrah é o máximo, Lima Duarte dá aulas de experiência em cena, Armando Bogus é incrível.” Ao lembrar de antigos trabalhos, a cada suspiro se deixa levar pelo mesmo tipo de adjetivação fácil. “A Tininha de Top-model era muito legal, a Patrícia de Meu bem, meu mal era bárbara.” Na hora da verdade, até o marido Totila Jordan, faixa preta de jiu-jitsu e dono de uma confecção, é bem mais convincente e decidido. “Aqui em casa você fala com gestos, por que não faz o mesmo na novela?”, pergunta à mulher sempre que acha Adriana contida demais. “Ainda tenho muito para aprender”, rebate a atriz.
Tem sim. Para que o atual namoro não seja lembrado daqui a alguns anos como um mero flerte do jogo de amores entre telespectadores e ídolos eletrônicos, Adriana Esteves vai ter que suar bastante. O primeiro passo, quem sabe, é seguir os conselhos do marido e mexer mãos e braços com mais expressividade. O segundo ela mesma já pescou. “Tenho que aprender a coordenar os meus horários para não ficar estafada. As atrizes mais maduras estão me ensinando isso.” O terceiro é urna questão de opção, e, por enquanto, ela parece estar indecisa.
CAMA DE CASAL – O terceiro é manter-se na mídia televisiva: acaba-se uma novela das oito como heroína, volta-se como menina decidida num folhetim das sete, fecha-se um ciclo, começa-se outro e nem pensar em abandonar a TV, nem pensar em deixar descansando a memória dos fãs. É aí que ela ainda se mostra titubeante. ”Depois de Pedra sobre pedra vou questionar as propostas de papéis em novela. Se não estiverem de acordo comigo, vou fazer teatro”, avisa. Pode não ser blefe. Na cabeceira da cama de casal em seu apartamento na Barra da Tijuca, além do clássico Madame Bovary, de Flaubert, e do best-seller Brida, do mago Paulo Coelho, a presença do livro A preparação do ator, do russo Constantin Stanislavski – leitura obrigatória em dez entre dez escolas de artes cênicas -, é claro sinal de que a ex-modelo que virou estrela na televisão não está a fim de brincadeiras.
A preparação de Adriana Esteves vai além do intelecto. Três vezes por semana ela pratica natação para manter a forma. E ainda: sempre arranja um tempo para moldar a voz grave em aulas de canto lírico. ”Vivo em função de minha carreira de atriz”, garante, com a gana de quem demorou para assumir a profissão, mas que não pretende sob hipótese alguma voltar atrás. Voltar atrás seria, por exemplo, se dispor a posar de lingerie para tablóides de lojas de departamentos.
Mais que isso: voltar atrás seria de novo viver entre areias e ondas das praias cariocas mais badaladas de cada verão, seria passar férias em Saquarema e Búzios, coisa que fazia sempre, sem falhar um ano sequer. Era época de ficar com os cabelos louros e os olhos esverdeados. Tempo de morey-boogie, de ”muita azaração”. Foi justamente numa dessas temporadas na Região dos Lagos que o dono de uma revista de surf propôs fazer um book com fotos de Adriana. Ela chegou a ter medo – tinha apenas 13 anos – de que algo fora do roteiro pudesse acontecer na sessão fotográfica. Nada disso. No ano seguinte, já tinha se tornado modelo disputada pelas agências.
A tiracolo, levava a mãe na peregrinação pelos estúdios. “Eu parecia a Brookie Shields”, compara Adriana Esteves. Se não assume que era melhor não ter que carregar o estigma de atriz-que-já-foi-modelo, volta e meia se refere àqueles trabalhos como bregas ou ridículos. Pelo menos um ensinamento a vida de manequim lhe deu. ”De um modo ou de outro, vestindo as roupas eu também interpretava um personagem”, analisa. Foi mesmo em revistas de moda que surgiram as primeiras caras e bocas de Adriana Esteves. A artista plástica Regina Esteves Agostinho, mãe da atriz, confirma a tese da interpretação. “Adriana sempre foi careteira, bastava ela ver um espelho e fazia um trejeito.”
MUITO MEIGA – Em 1987, Adriana teve seu primeiro contrato de exclusividade com uma agência. A empresária Maria Nilza, para comemorar o aniversário de sua firma, mandou fazer um pôster com 72 caras bonitas, todas exclusivas. Cinco anos depois, muitas das outras 71 podem até ter tentado a glória de uma carreira nos palcos ou na tela, mas a maioria continua nas passarelas. Somente Adriana Esteves emplacou como atriz. “Num dia eu a chamei na minha sala e falei: menina, a Rede Globo tem Xuxa e Malu Mader, mas tem espaço para você também”, lembra Maria Nilza, que forma no bloco dos que acham que a atriz tem tudo para ser a legítima sucessora de Regina Duarte no posto de namoradinha do Brasil. ”Ela é meiguinha, muito família, muito pai e mãe.”
A teoria faz sentido, mas não enche o ego de Adriana Esteves, que prefere fugir dos rótulos. Não faz questão nem de par romântico na próxima novela. “Eu posso fazer até uma pessoa má”, assegura. E mostra as suas armas. “Sei levantar as sobrancelhas e engrossar o jeito de falar.” Mas há de se ter cuidado: quando o assunto é namoradinha da TV, ou seja, quando o que está em questão é a possibilidade de as mães brasileiras sonharem em ter personagem ou atriz como nora, por bem menos que poses de megera muita candidata já perdeu o caminho do trono.
Malu Mader é rascante, ácida demais para o cargo. Alguns papéis que Lídia Brondi fez durante os anos 80, muito intelectualizados, a tiraram da concorrência. Letícia Sabatella logo na estréia viveu uma moça de programa de hábitos nada confiáveis. Glória Pires, que entre todas sempre foi a que mais intimidade demonstrou com o veículo, já deixou para trás os tempos de broto e está mais para noiva da cidade do que para namorada do Brasil. Desse jeito, vai acabar sobrando para Adriana Esteves.
Na visão de Regina Duarte, porém, a sucessão é coisa que ultrapassa meros dois turnos. “Antes de ser chamada de namoradinha do Brasil eu fiz bem mais do que duas novelas. Fiz dezesseis”, conta. E vai fundo na defesa do que considera propriedade particular. “O título é meu, ninguém tasca.” Até a própria Adriana Esteves concorda com a argumentação. ”Regina é definitiva”, decreta, sem no entanto esconder a alegria com o novo tratamento que anda recebendo. “Isso de namoradinha só revela uma coisa: o carinho que o público, os colegas e a imprensa têm comigo.
BERRO NERVOSO – Carinho. No repertório de palavras da atriz esse é o substantivo mais freqüente. Um exemplo: quando lembra do teste que fez para ser atriz da Globo, fala do carinho que o ator Jayme Periard, que contracenou uma cena de Anos dourados com a futura atriz. “Eu não falei para ninguém que estava fazendo concursos para entrar na Rede Globo, fiquei supernervosa durante semanas e dei um berro quando recebi o telefonema de um dos produtores de Top-model”, conta. Um papel na TV era o máximo para a ex-vendedora de loja de artigos esportivos que estudava Publicidade na Universidade Gama Filho e que nos intervalos das aulas virava sacoleira, vendia camisas de malha feitas pelo então namorado Totila. “O curso não era prioridade. Queria me formar em alguma coisa, não importava muito no que fosse”, admite Adriana Esteves.
Três novelas, dois casos especiais e um contrato novo depois do tempo em que vendia roupa no grito, ela agora desfila nas ruas da Barra da Tijuca dentro de um Kadett dourado. No mês que vem, sai do quarto e sala do apart-hotel onde mora pagando aluguel há um ano e se muda para um apartamento próprio, mais espaçoso, em frente. Vai levar o violão que deu para o marido tocar as músicas de Raul Seixas e pretende arrumar um canto melhor para os 40 ursinhos de pelúcia que hoje se atravancam no quarto. Eles são apenas uma pista: a nova namoradinha – como deve ser – não passa de uma menina tradicionalista, típica moça de família que exibe fachada de geração-saúde e que tem medo quando Totila anda de moto em altas velocidades. É assim que Adriana Esteves vai conquistando simpatias sempre que faz uma personagem mediana se transformar no destaque charmoso das novelas de que participa.
Na próxima quinta-feira, Marina e Leonardo vão insinuar um banho de cachoeira em Pedra sobre pedra. Insinuar é a exata palavra: as cenas foram gravadas há dez dias e que ninguém espere ver Adriana Esteves nua. Nem de longe, nem sombreada. “Não precisa, criar um clima é mais importante do que isso”, sacramenta a atriz. “A cena fica mais pura”, completa. No ano passado, o diretor do especial Marina não era tão bucólico e exigiu dela uma cena de nu completo. Aí não houve jeito: uma dublê lhe tomou o lugar, por causa de sua timidez. Coisa de menina bem comportada. Prova de que não é nem uma questão de ter ou não talento. Para encarnar uma nova namoradinha do Brasil, antes de mais nada, é necessário ser, sem disfarces ou tipos, o que Adriana Esteves é.
Jornal do Brasil
Lula Branco Martins
09/02/1992