VLADIMIR BRICHTA: “O PALHAÇO É UMA SUPERPROJEÇÃO DA ALEGRIA, MAS PODE SE AFUNDAR NA TRISTEZA”
Uma das estreias mais aguardadas do ano no cinema nacional, Bingo – O Rei das Manhãs, chega dia 24 de agosto nas telonas para contar a história inspirada em Arlindo Barreto, um dos intérpretes do palhaço Bozo. Protagonizado por Vladimir Brichta, o longa mostra a ascenção, derrocada de Augusto/Bingo, artista que se torna uma das grandes figuras pop dos anos 80, em uma trajetória cheia de sexo e drogas e digna de um rock star. Para dar mais liberdade artística ao roteiro, os nomes foram todos alterados – com exceção de Gretchen (Emanuelle Araújo).
“O filme Lobo de Wall Street foi um filme referência pra mim,
pois se passa nos anos 80 e tem a questão da droga e o poder. O filme reverbera esse discurso de que a fama ou poder, quando você realiza alguma coisa grande, mudam drasticamente a forma como o mundo te vê. Isso nos afeta muito e é difícil lidar com essas transformações e administrar o fascínio e poder que lhe dão. No caso dele ainda tem a ambiguidade de ser famoso (como Bingo) e ao mesmo tempo desconhecido (como Augusto)”, explica o ator em entrevista para QUEM.
Palhaço triste
“Tem 3 elementos que motivaram a fazer o filme: A relação do personagem com filho e a mãe, a luta pelo sucesso sob o ponto de vista do ator e a história do palhaço triste. É um pouco se perguntar, por exemplo, porque o Robin Williams se matou. É um cara que faz a alegria das pessoas e tem um lado tão sofrido e desajustado. O palhaço é uma superprojeção da alegria, mas pode se afundar na tristeza, inquietação e nos dilemas humanos. Isso me interessa e está no filme de forma rica”.
Paternidade
O filme retrata também o distanciamento de Arlindo com o filho conforme a carreira ganha força. Vladimir relembra que, assim como seu personagem, já sofreu com isso, mesmo que involuntariamente. “Briguei pela guarda da minha filha por muito tempo, então estive ausente. Neste caso, por uma força que não era meu desejo. Isso afetou muito minha vida, fui motivado pelo desejo de estar próximo e ser um pai presente”, relembra, ao falar sobre a primogênita Agnes, por quem lutou pela guarda na Justiça (Quando Gena, então sua mulher, morreu em 1999, Vladimir teve que disputar com a família da mulher a guarda da filha).
“Me lembro quando um diretor de teatro me encontrou. A mãe da minha filha tinha falecido há pouco tempo e ele passou por mim e perguntou ‘como é que está a sua filha?’. Eu estava fazendo um monte de peças e a Agnes estava passando um tempo com a minha mãe nesse período. Falei ‘ah, ela está com minha mãe, num sítio, muito legal..’, comecei a enaltecer. Ele me disse: “Legal pro filho é do lado do pai”. Senti um baque. Nunca esqueci disso, me norteou. A questão pai e filho sempre foi muito relevante nas minhas escolhas”, explica.
Proposta irrecusável
Escalado de última hora para substituir o amigo Wagner Moura no projeto, já que o ator estava envolvido com as gravações da série Narcos, Vladimir conta como surgiu o convite: “Nos encontramos, eu estava com o Lazinho (Lázaro Ramos), e Wagner disse: ‘Tem um filme que não vou poder fazer. É um dos melhores roteiros que já li, e um de vocês dois tinha que fazer’. Então, já sabia que era interessante. Quando o Daniel(Rezende, diretor) entrou em contato, me chamou pra bater um papo. Teve um momento em que quase não fiz porque pintou uma série na TV, mas deu certo e acabou rolando”, comemora.
A despedida de Domingos Montagner
A participação pequena, mas simbólica, de Domingos Montagner no papel do palhaço Aparício ganhou ares nostálgicos após a morte do ator e palhaço, em 2016 . “A presença dele foi uma forma de ajudar um palhaço mais novo (o próprio Vladimir) a se encontrar. É um paralelo com a história do filme, totalmente. Ver o Domingos atuando é tocante, emocionante”, conta Vladimir.
Ao lado do amigo Fernando Sampaio, com quem criou o grupo circense LaMínima, Domingos atuou como consultor da produção: “Tem muito dele (no filme). Quando fizemos a leitura do texto, ele fez ajustes e me tirou algumas dúvidas. Ajustamos muito de acordo com a experiência dele”, explica o ator.
“Já o Fernando foi o cara que me preparou para o personagem. Não que ele tenha me ensinado timing, isso acho que era uma coisa minha. Mas ajudou a desvendar o mistério que é ser um palhaço. Eu tinha pudor de dizer que eu era um palhaço, venho de um universo acadêmico e respeito muito as pessoas que estudam muito. Eu fazia minhas palhaçadas desde sempre, já me vesti de palhaço e tinha um timing, mas tinha pudor de me assumir palhaço, ainda que já pagasse as contas com humor. Hoje sou um palhaço”.
Fonte: http://revistaquem.globo.com/Entrevista/noticia/2017/08/vladimir-brichta-o-palhaco-e-uma-superprojecao-da-alegria-mas-pode-se-afundar-na-tristeza.html?utm_source=twitter&utm_medium=social&utm_campaign=post